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Nogueira da Silva (1830-1868) e a caricatura satírica

Maria de Aires Silveira
26 páginas

Francisco Augusto Nogueira da Silva (Lisboa, 1830-1868) morreu jovem, mas destacou-se nos periódicos de meados do século XIX como crítico social, através de ilustrações em xilogravura. Foi aprendiz de gravador na oficina do Arsenal do Exército, com doze anos, matriculou-se na Academia Real das Belas-Artes e por insistência paterna, abandonou os estudos para assentar praça como aspirante de marinha. Foi o diretor artístico da Revista Popular (1849-51) e interessouse pelo estudo técnico da gravura em madeira. Fascinava-o o inventário de
“Tipos nacionais”, o registo crítico de janotas à porta do café Marrare, no Chiado, de gaiatos pelas ruas, do noveleiro político e dos frequentadores do Passeio Público, em noites de iluminação. Também em A Semana, no mesmo ano, desfilavam figuras características lisboetas em “Mistérios do Chiado”, e alguns anos depois, em 1856, fundava o Jornal para rir, com a duração de um ano. Uma experiência inédita para a caricatura em Portugal, onde texto e imagem se ligavam, de forma original e humorística, apresentando figuras grotescas e
provincianas. Em 1856, neste jornal, evidenciou a caricatura de uma figura popular com intenções políticas, provavelmente inspiradora de Rafael Bordalo Pinheiro. No final deste semanário, um poderoso autorretrato e alguns textos com referências francesas de humoristas contemporâneos, Gavarni, Grandville, Cham e Philippon, revelavam conhecimentos de uma cultura visual, ligada à ilustração de periódicos estrangeiros. O periódico Arquivo Pitoresco, publicado a partir de 1857, sob a sua direção artística, distinguia-se pela técnica aperfeiçoada
da gravura em madeira, explorando um “museu vivo” de populares e burgueses, que se expunham em primeiro plano, entre a sátira e a hilaridade, um “petisco social”, esclarecia Nogueira da Silva. O prazer do riso estava presente na caricatura de uma “saia-basílica” no ónibus, na ostentação de riqueza do provinciano analfabeto, no cortejo domingueiro de famílias patriarcais, no galego da esquina, no barbeiro-sangrador… A surpreendente ousadia crítica das ilustrações das Obras completas de Nicolau Tolentino, em 1861, articulava-se com a defesa de ideais sociais, assumindo-se como professor gratuito de Desenho, no Centro de Melhoramento das Classes Laboriosas, e fundou a associação Civilização Popular. Nogueira da Silva foi um dos primeiros desenhadores ilustradores desta época a utilizar a caricatura, o traço simplificado, os sombreados excessivos e o desenho exorbitante, em situações caricatas.